Capazes de Abril
Filhas da repressão, netas do obscurantismo.
Num Portugal vergado, o que poderiam sonhar?
Donas de um nome e de um corpo emprestado.
Num Portugal amordaçado, poderiam um dia gritar?
Foi o vento de Abril. Trazido pelo medo e pela revolta.
Foram os cravos. Pintados de vermelho e de fé.
Fizeram delas mais do que eram.
Tornaram-nas mais do que podiam ousar ser.
Ser inteiras. Ser iguais.
Capazes de ir, sem autorização.
Capazes de reagir, com obstinação.
Capazes de desobedecer, com satisfação.
Querem agora relegá-las.
Empobrecer a sua voz. Encolher os seus sonhos.
Quebrá-las dentro de quatro paredes.
Subjugá-las ao medo e à insegurança.
Mas elas não cabem no local de onde vieram.
Partem muros. Rasgam os céus.
Porque não se prendem andorinhas.
E não se acorrentam tempestades.