Dia da Mulher
Guardam-se as flores e os doces numa caixa velha.
Os talões de descontos são rasgados.
Envergonham-se os que se lembram dos direitos das mulheres apenas neste dia.
Salva-se a mulher que, com a educação básica, teima em votar.
O homem que educa as filhas para gritarem por justiça.
A menina que estuda para saber e conhecer.
O rapaz que é incapaz de violentar a rapariga.
Rolam as fotografias e os sorrisos abertos.
Os encontros não faltam no dia.
Envergonham-se os que julgam que a mulher só deve ser recordada num só dia.
Salva-se a mulher que não inveja a empreendedora.
A avó que denuncia o agressor da vizinha.
O patrão que paga justamente à colaboradora.
A colega de trabalho que revela o assédio.
Arruma-se a vassoura num canto e dobram-se os aventais.
Abrem-se as janelas e grita-se bem alto.
Envergonham-se os que julgam que é possível voltar a colocar as mulheres no local de onde vieram.
Salva-se a mulher que teima em educar a filha.
O tio que discute política com toda a família durante o jantar.
A colega de turma que não critica a minissaia.
A sogra que não pergunta pelo próximo neto.
Cerram-se os punhos e grita-se mais alto do que nunca.
Não voltarão a estar agrilhoadas as mulheres.
Caladas e submissas. Ignorantes e passivas.
Juntam-se os verdadeiros maridos, pais e irmãos ao clamor urgente.
Deviam - verdadeiramente - envergonhar-se aqueles que olham para as mulheres e não percebem.
Não voltaremos a ser o que já fomos.